Suporto Esquema

Obra de 3,5 milhões na Câmara coloca Ariquemes diante de possível esquema de superfaturamento

Edital de ampliação da Câmara contrasta com crise nos serviços básicos


Ariquemes recebeu a publicação do edital de reforma, adequação e ampliação da Câmara Municipal como quem leva um choque de água fria no rosto. O documento, amarrado ao Processo Administrativo nº 00391/2025, revela logo na primeira página que a obra está orçada em R$ 3.496.009,74 para execução global, valor que aparece no cabeçalho da Concorrência Eletrônica nº 0001/2025. Esses números, dispostos com frieza burocrática no início do edital, contrastam com a vida real do município, onde cada área essencial parece operar no limite. A sede do Legislativo, reformada há pouco tempo, não apresenta sinais visíveis de saturação que justifiquem uma ampliação desse porte. Mesmo assim, o edital assegura que o objeto é a “execução de obra de reforma, adequação e ampliação da sede da Câmara Municipal de Ariquemes”, sem apresentar estudos de necessidade ou impacto.

O processo aparece repetido ao longo das primeiras folhas do edital, como na página 2, reforçando sua formalização e autorização sob o número 00391/2025, embora o texto não apresente laudos técnicos que sustentem a urgência da obra. Mais adiante, quase no final do documento, o mesmo número reaparece na Declaração de Não Vistoria, permitindo que empresas optem por não visitar o prédio antes de apresentar propostas. A declaração menciona explicitamente o “processo licitatório nº 00391/2025”, reforçando a ideia de que a vistoria presencial é facultativa, mesmo se tratando de uma obra milionária que mexe com toda a estrutura física da instituição.

Enquanto essas formalidades se repetem nas folhas do edital, o contraste cresce. Ao longo das páginas centrais, surgem exigências dirigidas às empresas, entre elas uma lista de documentos organizados em alíneas que incluem ata de fundação, estatuto social, regimentos internos, registros de presença e ata que autoriza a cooperativa a contratar. Essa estrutura detalhada aparece na página 23, organizada nas alíneas a a f. São exigências rigorosas para quem concorre, mas não há rigor proporcional na demonstração da necessidade pública da obra. O documento segue extenso, técnico, devidamente assinado, mas vazio de justificativa concreta.

O prazo de execução, descrito no início da parte técnica do edital, estabelece 300 dias corridos para conclusão da obra, contados a partir da ordem de serviço. Todos os materiais, equipamentos e insumos são de responsabilidade da contratada, como consta na página 3 do documento. A obra deverá começar imediatamente após o recebimento da ordem, mesmo sem que o edital demonstre por que a ampliação não pode esperar ou por que ela se tornou prioridade em meio às dificuldades enfrentadas pela cidade.

O conjunto dessas informações expõe a distância entre o texto oficial e o cotidiano de Ariquemes. O edital existe, é formal, jurídico e completo em sua aparência técnica, mas não se encaixa no cenário vivido pela população. A cidade acompanha cada linha porque entende que o impacto desse gasto não é abstrato. Ele recai sobre um ambiente onde escolas, unidades de saúde e serviços básicos convivem com limitações constantes. Diante disso, a obra da Câmara não aparece como resposta a um problema, e sim como uma iniciativa isolada, desconectada do que a cidade pede.

Ariquemes segue observando o trâmite desse edital de 43 páginas. Cada número, cada item e cada assinatura ajudam a reforçar que a obra está preparada para sair do papel. O que não aparece em nenhuma das folhas é a resposta que mais importa: por que investir R$ 3,5 milhões num prédio que não demonstra qualquer urgência enquanto as demandas essenciais continuam esperando prioridade?